A tribo urbana dos headbangers
Em meu trabalho de conclusão do curso de bacharelado em Ciências Sociais, discorri sobre um tema ou assunto que se encontra muito presente na sociedade atual, mas que poucos são aqueles que escrevem um artigo ou texto de caráter científico ou metodológico sobre o mesmo, que é o das tribos urbanas no cotidiano moderno. Trata-se, no caso, de grupos de jovens (em sua maioria) que se unem e se organizam com o intuito de promoverem atividades artísticas, curtir shows e eventos musicais, organizar atividades políticas, participar de cultos religiosos – sem nenhuma finalidade de caráter normativo, individualista ou racional, mas sim estética, artística e emocional. E na minha pesquisa, em particular, discorri especificamente sobre a ”tribo” dos chamados headbangers (metaleiros na linguagem popular), que são os fãs do estilo musical do Heavy Metal.
Afinal, quem são os headbangers? Do ponto de vista estético, os headbangers, de uma forma geral, se vestem de preto, possuem cabelos compridos e utilizam utensílios ou acessórios que são incorporados à vestimenta (correntes, braceletes, pulseiras, bota etc.). Em suas roupas há diversos arquétipos e simbologias próprias, que foram criadas justamente para representar o estilo musical que escutam. Pode-se perceber a presença quase que generalizada e padronizada, por exemplo, da figura de uma caveira, de sangue, do demônio, dragões e personalidades míticas que formam a própria identidade do Heavy Metal.
O Heavy Metal, enquanto estilo musical, surgiu no final dos anos 60 na Inglaterra, em meio às classes suburbanas e médias do país, como uma forma de protesto ou de insubordinação a tudo aquilo que estava ocorrendo no mundo da época, como a grande influência do Industrialismo bélico e global no estabelecimento de guerras, violência, miséria generalizada, pobreza, da corrupção política…
Com o passar do tempo, foram surgindo diversas vertentes dentro do próprio Heavy Metal que foram adquirindo identidades, arquétipos e propostas próprias, sem necessariamente estar ligada a alguma causa política ou ideológica, como a New Wave of British Heavy Metal (criada nos anos 80 com bandas como Iron Maiden) o Thrash Metal (surgido nos anos 80 nos Estados Unidos e na Alemanha com bandas como Slayer, Metallica, Destruction e Kreator), o Power Metal (que apareceu na Alemanha e na Finlândia, com bandas como Helloween, Accept, Stratovarius, Sonata Arctic etc ), e o Black Metal, com bandas como Burzum, Behemoth e Venom. Não me aprofundarei no assunto em específico das características estruturais e rítmicas dos subgêneros do Heavy Metal e nem na citação das INÚMERAS outras vertentes deste estilo, pois não é o objetivo do artigo e nem do meu trabalho.
Os headbangers se organizam principalmente em shows, eventos musicais, bares e grandes galerias e centros (como a famosa Galeria do Rock na São Bento, em São Paulo) com o intuito de promoverem laços de solidariedade e união através da música e do compartilhamento de conhecimento e experiências com relação à mesma. É na hora dos shows musicais que se presencia a catarse emocional dos fãs do estilo e é onde se manifestam, nitidamente, os ritualismos presentes entre eles. E é exatamente nesse momento que a sua autonomia enquanto grupo é evidenciada. Em muitos momentos de empolgação, os headbangers praticam danças como o banging, que se baseia em um movimento violento do pescoço para frente ao ritmo da música e os moshs (fãs que sobem ao palco e se jogam para a plateia), além do famoso “sinal demoníaco”, que é feito com as mãos em qualquer momento do espetáculo musical para representar, através do dedo mindinho e do indicador, a figura do diabo e “o poder da música sobre o corpo”. Na verdade, esta simbologia manual foi criada em um contexto bastante diferente, mais especificamente na Itália da Idade Média onde o sinal (chamado tradicionalmente de Corna) servia para grupos arcaicos espantarem, através de rituais, o mau olhado ou alguma outra maldição, mas que foi incorporada à Modernidade através do Heavy Metal.
É essencial prestar atenção nestes tipos de relações micro-sociais, pois são elas que moldam as características básicas da nossa vida cotidiana e lhe dão uma forma rica e variada, que fogem do padrão clichê da análise pelo viés macro da Economia e da Política. Não se pode negar a importância da existência das tribos urbanas somente porque a sua atuação na sociedade não possui um valor utilitário no sentido de “procurar transformar o mundo”. Ao ser um sociólogo, é necessário bisbilhotar a realidade e investigar suas inúmeras características e dimensões, para que se possa olhá-la por ângulos diferentes e descobrir o quanto ela pode ser complexa, e acima de tudo, MÁGICA.
Texto: Victor Seiji Endo
Vitor é sociólogo e amante de literatura erudita.
Imagem: Luciana Nagata
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